Site não oficializado do Sport Clube Penalva do Castelo.
A força penalvense desde 1945 no desporto e no futebol com paixão...

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Artigo de Reflexão: "A magia da Taça de Portugal"

Futebol

Tema: "
A magia da Taça de Portugal"


Artigo publicado in SporTViseu 24 Outubro 2012

Autor: Luís Paulo Rodrigues

A Taça de Portugal, não sendo novidade para ninguém, assume uma vertente carismática e mítica na história do futebol português.

Não tenho grande experiência de Taça como adepto e praticamente nenhuma como “profissional” de comunicação social. Tive oportunidade de fazer os dois jogos do Sampedrense em que foi eliminado, quer na época passada, quer esta época. Tinham sido os únicos jogos até ao momento e, sentindo, de facto, uma certa diferença entusiástica ao fazer esses jogos (sobretudo no jogo do ano passado em Santo Tirso, onde ficou um sentimento de injustiça). Como adepto, a época passada foi marcante, já que acompanhei vários jogos da campanha da Académica, culminando na invasão de campo em Santa Maria da Feira, na meia-final. Ao Jamor só não fui por impossibilidades de última hora.


Bom, não me parece que estou a ser lá muito objectivo e interessante. Vamos ao que interessa!
Este fim-de-semana fui incumbido de ir com um colega acompanhar o Penalva do Castelo na deslocação a Fátima, para o órgão onde colaboramos, a Rádio Lafões. Ora, no breve estudo das equipas no dia anterior, fiquei com uma preocupação que não me coíbo de partilhar: “é jogo para estar resolvido ao intervalo, portanto, sendo a única partida da emissão, com que raio de matéria vamos nós conseguir entreter o resto da partida?”. É verdade. Acredito que existe grande diferença competitiva da III para a II Divisão e ainda mais este ano. Ainda assim, como em tudo, há uma réstia de esperança. Já tinha visto o Penalva este ano e se há coisa que saltou à vista foi a alma. Por outro lado, a Taça costuma causar espanto de quando em vez. Bem, não deve ser nada, vamos lá fazer o joguinho e, falávamos já na viagem, esperar que não houvesse prolongamento para voltar a horas decentes.

Saída depois das 10h, um recorde pessoal. Nacional fora, que as portagens são caras e a contenção passa por aí. Morrinha matinal de domingo, que suscita ânsia pelo regresso aos lençóis. Restaurantes e cafés consecutivamente encerrados (faço ideia da afluência dos longínquos anos 90). Conversa futebolística para entreter as horas de asfalto. Paragem no Pinto, para um bife à casa (boa escolha). Chegada a Fátima com peregrinos na rua, afluência habitual para um domingo. Local de retiro? De reflexão? De fé? Fátima é uma autêntica montra comercial!
Chegados ao estádio, tudo nos conformes, com alguns percalços que fazem parte das burocracias excedentárias do nosso Portugal. Ambiente tranquilo, pouca gente (em Fátima trabalha-se ao domingo e descansa-se à semana), Abel Silva com olhos nos craques da casa emprestados pelo Benfica, Mozer a ensaiar um regresso aos bancos depois do malfadado Portimonense, André Gralha no apito, começa o jogo.

Fátima a dar de barato a primeira parte, com dificuldades em entrar no último terço do terreno. Penalva bem organizado, mas fraco nos contra-ataques. Antes do intervalo, uma substituição – um dos craques lá para dentro que o jogo tem que ser agitado. Comentário: “sim, o Penalva está a surpreender com a sua bela organização defensiva”. Pensamento: “este menino tem pinta de quem vai quebrar os rins a alguém a qualquer momento”. E se há prolongamento?
Segunda parte a bom ritmo, com muito mais Fátima. Oportunidade a oportunidade, o tempo vai escasseando, o Penalva vai acreditando, o Sérgio (sim, o capitão, de 20 anos… em cada perna) parecia um miúdo quando sabe que vai algum olheiro observá-lo para o levar para um grande. Comecei a ficar contagiado por aquele brio, que fibra! Já estou a desejar o tal prolongamento, quando dou por mim. Já estou a desejar que o Zé Carlos faça uma arrancada, sirva o Flávio em profundidade e este cruze para a cabeça do inesgotável Dedé. Então? Porquê? Sou um suposto “jornalista”, a ética manda que eu esteja quieto no meu canto, impõe que eu me mantenha imparcial, que eu seja frio. Ok, vamos tentar manter o nível.


Fim dos 90 minutos e o nulo. Vá, relaxar, urinar, apanhar ar fresco, beber dois goles de água. Toca a retomar os comentários, novamente a frio. Aproximam-se os (poucos) adeptos do Penalva da cabine de imprensa para saberem os resultados da Honra. Observei-os em silêncio. Num olhar, a esperança de gente humilde. Num grito de incentivo, o sacrifício da longa viagem. Num suspiro, a devoção a um clube que, provavelmente, acompanham desde crianças. Não sou daqueles inquebráveis que dizem que gostar deste ou daquele clube é que é único, é que é diferente. Acho que cada um gosta da forma particular que entende. Não se mede. É como a história da “mística”. Teoria da treta! Mas, naquele momento, não me contive mais. Vesti a camisola. Vamos Penalva! Está visto que chegar à baliza contrária é mentira, portanto toca de aguentar, entre cãibras e limites físicos, o resultado até aos penaltys. Feito!
Começa o Fátima. O mais novo dos adeptos penalvenses, talvez com os seus 15 anos, diz-me que não vai conseguir ver. Isso, enerva ainda mais o rapaz da rádio, que já está pouco atrapalhado com a sua falta de ética no trabalho. Ética? É a cadeira que eu ando a fazer em atraso. Que se lixe a ética! E entretanto o Ferrari já estava a defender o primeiro penalty. Depois, o Ascenso mandou por cima. Pronto, o Fátima agora galvaniza-se e, mais tranquilo, a marcar primeiro, acaba com isto. Nada disso. Um atrás do outro, os do Penalva não vacilavam. Esbracejava como um adepto na bancada, festejava, desesperava e, a meio, tentava ser coerente nos comentários radiofónicos. Não deve ter resultado. Quinto penalty, um dos miúdos que tínhamos destacado vai para a bola sem confiança, apanha muito balanço, não acerta o passo, estava nervoso. Falhooou!
Se o Alfredo marcar… o Penalva passa! Naquele momento fiz um compasso de espera. Olhei para um lado, vi o Jorge a tremer com o microfone e a respirar fundo. Olhei para o outro, estavam os adeptos do Penalva com as mãos na cabeça. A um só momento, todos esperneámos ao sabor do pontapé do número 5. Ele correu como um desalmado pelo campo fora, imitando os célebres festejos do Pauleta. Outros correram para erguer o Bruno Ferrari, lavado em lágrimas por problemas familiares (o que me custou entrevistá-lo depois…).

Fez-se Taça! Consegui perceber bem melhor o que a torna tão peculiar. Estará o leitor a pensar, certamente: “que folclore que por aqui vai, nem foi um acontecimento assim tão marcante, foi só um jogo de futebol, este acordou hoje para a vida”. Não discordo, a frio. Mas o sentimento de realização fez-me pensar. Saí de casa às 10, cheguei à 1h da madrugada. Perdi mais um domingo. Não compensou financeiramente. E então? Valeu bem a viagem! É por coisas como estas que vale a pena o futebol. É por isto que há tanta paixão por uma coisa que, vista do exterior, parece fútil. Adoro futebol!


Texto: Luís Paulo Rodrigues

Fotos: CinZa