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terça-feira, 6 de novembro de 2012

Artigo de Reflexão: "Aposta de base na formação é decisiva no triunfo do treinador português"

Futebol

Tema: "
Aposta de base na formação é decisiva no triunfo do treinador português"


Artigo publicado in Jornal Público 09 Outubro 2012

Autor: Manuel Mendes

Entre as principais Ligas europeias, a portuguesa é a única que conta apenas com técnicos nacionais. Lá fora, Portugal tem o treinador mais bem pago do mundo e o mais jovem entre a elite

Corria a temporada de 1986-87 quando o FC Porto, sob o comando de um jovem treinador português, conquistou a Taça dos Campeões Europeus. O feito pertenceu a Artur Jorge que, aos 38 anos, pegou na equipa portista. Na terceira temporada ao serviço do clube, ganhou o maior troféu europeu. De seguida teve uma proposta milionária para o RCF Paris. Não resultou. E foi preciso esperar 17 anos para José Mourinho igualar o feito e colocar os olhos do mundo nos treinadores portugueses.
O efeito “Special One” não só levou os clubes internacionais a procurarem técnicos nacionais, como despertou os emblemas portugueses para passarem a apostar em treinadores muito novos. O modelo ganhou tal dimensão que, esta temporada, a Liga portuguesa é a única apenas com treinadores nascidos no país e com a média de idades mais baixa: 43,7 anos. A somar a tudo isto, Portugal tem o treinador mais bem pago do mundo, José Mourinho, e o mais jovem daqueles que trabalham nos principais campeonatos do Velho Continente: André Villas-Boas, de 34 anos.

Só esta temporada estrearam-se na Liga três técnicos com menos de 40 anos: Marco Silva (35 anos, Estoril), Nuno Espírito Santo (38, Rio Ave) e Paulo Fonseca (39, Paços de Ferreira). Ricardo Sá Pinto (39 anos) também entrou no lote, mas saiu entretanto do Sporting e foi substituído interinamente por Oceano. E no clube discute-se agora se a melhor opção será a entrega da equipa a um português ou a aposta num técnico estrangeiro.



Paulo Fonseca, 39 anos, chegou esta época à Liga principal, para orientar o Paços de Ferreira

“Um factor para este rejuvenescimento dos treinadores portugueses estará na existência de casos como o de José Mourinho e André Villas-Boas, que são manifestações reais de um sonho de muitos jovens portugueses: treinar uma equipa de topo no futebol internacional. Algo que até há pouco tempo era reservado a uma elite com muitos anos de experiência é, hoje em dia, possível a quem demonstre ter as qualidades humanas e o conhecimento teórico adequado, mesmo que tenha menos de 35 anos”, explica Gastão Sousa, coordenador do curso de Gestão Desportiva do ISMAI.

Este catedrático, de resto, também destaca como factor primordial para esta aposta o ajustamento dos clubes à realidade económica. “É um factor que coloca maior prudência na altura de contratar o treinador: os valores envolvidos serão menores, as regras contratuais mais flexíveis e com menos encargos. A estrutura directiva dos clubes é constituída, hoje, por dirigentes mais jovens, com uma formação académica e uma experiência empresarial mais alargadas, que procuram treinadores que partilhem da mesma linguagem e dinâmica de trabalho”, acrescenta.

O investimento feito pelos próprios técnicos, que desde muito jovens procuram preparar-se para as exigências da função, também contribui para esta tendência. “Os treinadores portugueses habituaram-se a trabalhar com poucos recursos e a puxar pela imaginação, investindo continuamente na sua formação. O efeito Mourinho foi a cereja em cima do bolo de um trabalho em que Portugal foi pioneiro na formação de treinadores: foi o primeiro, em 1984, a exigir quatro níveis de formação. Mourinho deu visibilidade e credibilidade a treinadores portugueses que já tinham realizado grandes trabalhos em países com menos impacto mediático”, refere o ex-presidente da Associação Nacional de Treinadores de Futebol, Silveira Ramos, que entretanto transitou para os quadros das Federação Portuguesa de Futebol.

“A aposta dos nossos clubes nos jovens vem ajudar uma indústria importante e permitir que imensos talentos continuem a aparecer”, sublinha Silveira Ramos, garantindo que os mais experientes treinadores portugueses estão a trabalhar além-fronteiras. “Procuram outra estabilidade financeira”.

Recorde-se que quando Artur Jorge foi campeão europeu, 25% das equipas portuguesas eram orientadas por estrangeiros (o Benfica, de resto, foi campeão com John Mortimore) e que José Mourinho, em 2003-04, tinha três adversários estrangeiros a nível interno.




“O investimento numa carreira de treinador passou a ter uma existência própria. O investimento na formação académica e prática no treino desportivo é algo que se decide cada vez mais cedo. É nesse sentido que se assiste a uma maior qualidade e quantidade de jovens licenciados em Desporto que procuram no treino desportivo uma forma de progredir profissionalmente”, analisa Gastão Sousa, salientando também o papel dos empresários na forma como promovem os jovens junto dos dirigentes. “Os treinadores em início de carreira procuram os serviços de empresários para promover a sua imagem junto dos clubes, algo a que os seus colegas de profissão mais velhos não estavam habituados”, remata.

Brasil segura os melhores

Se Portugal não tem, actualmente, qualquer técnico estrangeiro na Liga principal, já a Inglaterra bate todos os recordes, contando apenas com quatro ingleses (os restantes treinadores dividem-se por dez nacionalidades). E tem também o mais veterano de todos: Alex Ferguson, que, aos 70 anos, está há 27 temporadas no Manchester United. Já a França, que é de longe o país, dos cinco principais campeonatos europeus, com técnicos mais experientes (média superior a 51 anos) e a Itália têm apenas dois nomes que não são nacionais.


Um outro aspecto curioso é a total ausência de treinadores brasileiros, que anos antes proliferavam pelos relvados europeus. Mas a explicação, segundo o vice-presidente da associação de técnicos brasileiros, é muito simples: tem a ver a com a capacidade económica do Brasil e com a crise europeia. O crescimento do país permite-lhe segurar os seus maiores talentos.

“Continuamos a ter grandes técnicos, mas o aspecto financeiro europeu já não é atractivo. Aqui recebem salários ao nível dos melhores. O Scolari, por exemplo, é um dos mais bem pagos a nível internacional”, refere Carlos Alberto Torres, adiantando que já não existe o mesmo poder de atracção do Velho Continente. “Nem os campeonatos conseguem ser superiores. Veja-se o caso de Itália”, continua. “Além disso, o Mundial vai realizar-se aqui e todos os olhos estão colocados no Brasil, que consegue mesmo segurar os melhores. O Neymar, por exemplo, continua no Santos com um salário ao nível dos melhores do mundo”, remata.


Portugal, pelo contrário, tem alargado a sua representação pelo mundo. Fernando Santos é o seleccionador da Grécia, Manuel José foi ídolo no Egipto ao vencer tudo o que havia para ganhar com o Al Ahly, Henrique Calisto brilhou no Vietname e Jesualdo Ferreira orienta o Panathinaikos. E estes são apenas alguns exemplos. Até porque o futebol chinês procurou em Portugal alguém capaz de ajudar a desenvolvê-lo, como é o caso, entre outros, de Jaime Pacheco.