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sábado, 21 de julho de 2012

Artigo de Reflexão: "O futebol como coreografia da vida"

Ao folhear o jornal Público do dia 28 de Junho de 2012, saltou à vista uma reflexão sobre futebol, começando pela frase “O futebol como coreografia da vida” do deputado do PS, Francisco Assis, que escreve às quintas-feiras naquele diário. “Gosto de futebol como jogo, paixão, estratégia, coreografia e vida. Está lá quase tudo.”

O timming da reflexão foi adequado ao Campeonato da Europa de Futebol Sénior de 2012, decorrido recentemente.


"Deve um homem resistir ao espírito do tempo? Talvez, mas não em demasia. Hoje apetece-me escrever sobre futebol, esse objecto de paixão estética e devoção fanática." Esta última parte, mais a ver, com um clube individual. "...a minha angústia e minha promessa de felicidade de cada fim de semana, e não é agora para aqui chamada. Regressará nos finais de Agosto."

O autor refere na altura, que era início de Verão, acompanhando o Europeu de Futebol, que encontrou o futebol enquanto pureza original. "Há muitos anos que leio livros, crónicas jornalísticas, pequenos ensaios sobre tão curioso assunto. O futebol é tão belo enquanto espectáculo sensitivo como na qualidade de representação e divagação. Gosto do futebol como jogo, paixão, estratégia, coreografia e vida. Está lá quase tudo." Assis faz referência a uma expressão de Albert Camus, esse filósofo com lado solar, que afirmou um dia: "Tudo o que sei sobre a moral devo-o ao futebol." Considera ainda, o autor uma frase lapidar e extraordinária, citando ainda outro passo: "Aprendi que a bola nunca vem até nós por onde a esperamos. Isso ajudou-me durante a vida, sobretudo nas grandes cidades onde as pessoas não costumam ser propriamente rectas."


Afirmando ainda, vincadamente, que "com o futebol aprendeu a ganhar sem se sentir um Deus e a perder sem se sentir um lixo". Ele era guarda-redes na equipa da Universidade de Argel, onde então estudava. A sua opção no campo de jogo tinha uma razão de ser pobre, quase miserável, a sua avó inspeccionava-lhe todos os dias o estado dos sapatos, pelo que ele teve que optar pela posição em que estes menos se desgastavam. Camus, um dos grandes pensadores da liberdade, foi afinal de contas guarda-redes por razões de necessidade. Isso não o impediu de encontrar no futebol os princípios essenciais que fundariam a sua filosofia moral, refere Francisco Assis.


"Se sei tudo isto, devo-o a um homem, uruguaio, romancista, jornalista, ensaísta, chamado Eduardo Geleano. É verdade que gosto de ler Segurola, Luís Fernando Veríssimo, Jorge Valdano, que me extasio com os textos de Mário Filho, ainda por cima prefaciados por Nelson Rodrigues, mas considero Galeano o mais extraordinário de todos. Escreveu um livro notável intitulado Futebol: Sol e Sombra, felizmente editado em português com prefacio de Jorge Marmelo, jornalista do Público, antigo jogador do Ramaldense e escritor de invulgar qualidade. Em Galeano o futebol transmuta-se em epopeia, história, poesia e filosofia".

O autor fazia uma referência ao jogo Itália - Inglaterra, relativo às meias finais do Campeonato da Europa.

Refere-se, sobretudo, ao desempate por grandes penalidades, comentando de forma curiosa e muito interessante: “Já não há mais jogo, só penaltis. O estádio pára. O tempo desaparece. Estamos perante a tirania da geometria pura. De um lado um marcador, de outro um guarda-redes. Esquecemos-nos que são homens, que de certa forma deixaram de o ser. Solidão absoluta envolta numa multidão muda e expectante. Não é imaginável uma situação mais cruel. Pura existência individual confrontada com o destino. (…) Curiosa metáfora de tantas vidas. Contudo, num instante tudo mudou.


A Inglaterra no caso, começou por levar vantagem devido ao falhanço de um jogador italiano que aparece estar em baixo de forma. A injustiça parecia estar prestes a consumar-se. Eis que surge Pirlo com o seu talento e a sua longa experiência. Ele sabe que está só diante do guarda-redes, da baliza, do estádio, da multidão silenciosa, talvez até, e sobretudo, do seu próprio destino. Não opta pela banalidade, recusa um registo burocrático e ousa marcar um penalti "à Panenka". Não falha. Aquele golo é muito mais do que um golo. É arte, é paradoxalmente imprevisibilidade e destino. Os ingleses que se seguiram falharam. A Itália ganhou. Dir-se-á que foi feita justiça. Provavelmente foi o génio que triunfou. Seria reconfortante pensar que as duas coisas andam a par. Fiquemos satisfeitos por admitir que por vezes elas não se contrariam. Já não é pouca coisa.(…)”


A vida é feita de instantes de arte, justiça, injustiça, génio, crueldade, azar… Feita de instantes de glória e de falhanços.


Adaptado por João Poças (Julho 2012)