Desporto - Futebol
|Espaço Universidade
Artigo publicado in Jornal A Bola online 31 Julho 2015
Autor: José Neto
"Pré época
Planeamento e Periodização do Treino e sua importância para o futuro de uma equipa na construção do sucesso!…"
"Planeamento e Periodização do Treino e sua importância para o futuro de uma equipa na construção do sucesso!...
Na
sequência do trabalho anteriormente publicado, correspondente às
diversas conceções de treino e sua adaptação para a conquista das
condições que permitam obter o sucesso, iniciarei uma abordagem onde
conste uma evolução de circunstâncias que fizeram da pré – época,
história.
Em tempos que se considerava que uma pré época
devidamente estruturada, daria para alcançar resultados
significativamente positivos para todo o ano desportivo, as cargas de
treino assumiam por vezes um autêntico drama para os “heróis” que tinham
que as suportar. O volume prevalecia sobre tudo o que compunha as
restantes características do treino, sendo os atletas sujeitos a
autênticos desafios de bravura e heroicidade, suportados por corridas em
perseguição calcorreando o escadório das bancadas, (quantas vezes
carregando com bolas medicinais, alteres e mesmo o peso de
companheiros), corridas em grupo pelos bosques, areais … percorrendo
longas distâncias intervaladas por saltos entre paredes, arrastando
troncos de árvores, deixando os atletas pelo caminho, suor, sangue e
gemidos, que nem um chuveiro fresquinho e prolongado chegava para
derreter tanta agonia. Até se dizia, a título de gozo, “quanto mais dor
mais amor” … e a tão apetecida bolinha só aparecia 1 ou 2 semanas após
este tempo de autêntica tortura.
Embora registasse esses exemplos
de agonia por informação que era me transmitida, tive a felicidade de
encorpar equipas técnicas, a partir do início da década de 80, em que
por intermédio de quem liderava com novidade outros projetos de futuro,
com esta máxima que jamais haverei de esquecer. “ Olha para o jogo e ele
te dirá como deves treinar” (José Maria Pedroto), seguido por Artur
Jorge, etc…
Não obstante no micro ciclo semanal de treino
efetuasse uma ou outra saída para espaços exteriores ao estádio, uma das
sessões de treino via contemplada a parte técnico tática em formas
competitivas de jogo.
Quando se aborda nos dias de hoje, métodos
de treino bidiário ou tridiário numa pré época, poderei referir a título
de exemplo, (de forma muito resumida), uma sessão que consta dum
dossier que ainda permanece escrito e que faz memória:
7 horas – acordar - avaliação da frequência cardíaca e peso corporal;
7.30
– corrida continua (30 a 40 minutos) em regime de endurance, em que se
procurava que cada jogador mantivesse a sua pulsação numa escala
(220-idade x 70%); retorno à calma com alongamentos e hidratação.
8.30 – pequeno almoço, seguido de tempo livre para leitura de jornais, jogos de salão, etc…
11.00
– treino de potência no espaço próximo do hotel, sala de musculação ou
estádio – método da repetição com intensidade elevada, usando cargas a
30%da força máxima em estações especificamente indicadas para as zonas
musculares de maior incidência. No final treino, utilizando a piscina da
zona hoteleira em estágio, realizando atividade livre dentro de água,
associando exercícios de estiramento e relaxamento geral.
12.30 – almoço, seguido de descanso
17.00
– treino tático - técnico, tendo em atenção os princípios inseridos na
construção do modelo de jogo e as características dos jogadores,
procurando sempre a repetição pelas ações que se viam positivas, no
sentido de adquirir a dinâmica coletiva das rotinas em sucesso.
É
evidente que os atletas eram submetidos a testes de início de época,
divididos por 3 categorias: antropométricos – peso, altura, pregas
cutâneas e avaliação de percentagens de gordura; cardiovasculares –
índice cardíaco e teste de ruffier, sendo substituído pelo teste de
esforço com avaliação do consumo de oxigénio; motores – testes de força,
resistência, velocidade e flexibilidade.
Para além de outras
observações em testes ao nível laboratorial, cada atleta figurava num
dossier onde o registo destas e de outras informações (sociais,
familiares, historial clínico e competitivo), fazia parte.
Já que
abordamos esta questão dos testes, afigura-se-me de muita importância
sua aplicação, quer no início da época, quer no decorrer da mesma em
períodos especificamente determinados pelas equipas técnica e médica.
Contudo, devemos ter em atenção que a realização de testes de esforço
máximo para atletas que estão a iniciar a época com zero treinos
realizados, poderemos ocasionar situações de dúvida na sua eficácia e
inclusivamente sendo portadores de possíveis lesões. Sendo assim, o
melhor seria efetuar este tipo de avaliação em testes, na 2ª ou 3ª
semana de trabalho.
Temos neste domínio uma diversidade de
elementos que poderão concorrer para uma avaliação de competências
físico-técnicas-atlético-psicológicas-mentais –fisiológico-laboratoriais
e funcionais.
Tomamos alguns exemplos, nomeadamente ao nível da
antropometria (peso, medidas e pregas cutâneas, bioimpedância, podologia
… ); ao nível cárdio funcional (prova de esforço, avaliação VO2mx,
medida de lactatos … provas de campo com utilização do
cardiofrequencímetro e GPS na avaliação de rendimento …); ao nível da
potência muscular …( máquinas isocinéticas, counter moviment jump,
células fotoelétricas …); ao nível psicológico e mental (avaliação da
componente motivacional, stresse ansiedade, atenção e concentração,
locus de controle, formulação de objetivos, autoconfiança, liderança,
coesão …).
Em termos de treino numa pré época, diário, bidiário
ou tridiário, o fundamental é associar a qualificação do desempenho à
exigência que a função no jogo o determina (avançado, médio, defesa,
g.redes) e a especificidade para a qual se reforça a aptidão. Lá
voltamos ao princípio e novamente à frase que me salta para a memória e
eu persigo em cultivar, porque jamais deixarei de evocar: “queres
treinar bem? - olha para o jogo e ele te dirá!...” – senhor Pedroto.
Em
termos tático-técnicos do jogo, a pré época também se torna
fundamental, pois aí se devem encontrar as premissas do modelo de jogo
como referência que deve orientar a construção de situações e exercícios
no processo do treino, sendo estes planeados, praticados e avaliados de
acordo com o modelo de jogo, a partir de métodos que evidenciem uma
maior ou menor intensidade que possibilitem ao jogador um determinado
comportamento, que de forma instintiva e automática se irão refletir no
automatismo evocado pela performance da equipa como um todo.
O
capítulo da observação e desempenho da equipa (assunto que mais tarde
irei referir em capítulo especialmente preparado para o efeito), deve
estar presente no imediato trabalho efetuado numa pré época, tendo em
atenção algumas vertentes, tais como: modelo de jogo adotado ( sistema
de jogo, organização ofensiva – variantes táticas, ocupação dinâmica dos
corredores, poder de iniciativa, etc; organização defensiva – variantes
táticas, tipo de marcações, pressing, etc; transições – mudanças de
atitude à perda de bola, etc; bolas paradas – estudo e treino de
eficácia … E… outras e muitas outras questões se deverão colocar no
entendimento para a qualificação do desempenho: qual a vantagem da posse
de bola e sua relação com o resultado??? Qual a eficácia relativa e
absoluta do ataque, tendo em atenção a média para os remates e estes
para a concretização em golo??? Quais os jogadores e condições mais
capazes de os operacionalizar??? Qual a medida de tempo de um contra
ataque com êxito??? Quais os rankings de sucesso no âmbito do passe, da
interceção e do desarme ???
Perguntas e mais perguntas que cada
vez mais submetem o treinador e sua equipa técnica para uma informação
altamente qualificada e que deve fazer parte do reportório na gestão
operacional das condições que possam ser convertidas em sucesso.
É
prioritário impor logo na pré época um diagnóstico dos esforços
participativos de cada atleta no modelo de jogo a ser consagrado. Para
isso torna-se fundamental conhecer as ações que o jogo mais exige, para
no decorrer dos processos de treino se possa adequar a metodologia mais
capaz para responder às prestações da equipa na corrida para o êxito.
Mas
como tudo isto jamais será um processo acabado, devem ser criadas as
condições para promover e articular a discussão à volta do tema em
apreço e em que cada participante necessariamente terá que começar por
perguntar, depois por ouvir e a seguir dialogar, fazendo de cada ideia
uma oportunidade válida para a (prender) a vida!…
É claro que
isto não “encaixa” naqueles que pensam que qualquer metodologia que
contenha algo de novo, ainda possa constituir matéria ofensiva,
porquanto de Futebol … tudo sabem. Para esses, aconselho o pensamento de
Karl Popper: “ a solução de qualquer problema origina novos problemas à
espera de solução” ou do nosso sempre querido Professor Manuel Sérgio “
enquanto existe o método explicativo para tratar a ciência, é preciso o
método compreensivo para tratar as outras áreas do saber” …"
José Neto
Metodólogo de treino Desportivo
Mestre em Psicologia Desportiva
Doutor em Ciências do Desporto/Futebol
Formador de Treinadores F.P.F. – U.E.F.A.
Docente Universitário